Entidades jornalísticas manifestaram repúdio à série de ações judiciais contra A GAZETA por causa da charge, do cartunista Amarildo, publicada na edição do dia 18 de fevereiro de 2017, sábado do Carnaval de Vitória, uma semana antes do carnaval oficial. Em nota assinada por Associação Nacional de Jornais (ANJ), Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner), as entidades apontam possibilidade de “assédio judicial”.
“A ação coordenada contra determinada publicação jornalística pode ganhar contornos de assédio judicial”, diz trecho da nota.
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O material lembra ainda o caso ocorrido ano passado com o jornal Gazeta do Povo, do Paraná. Juízes e promotores entraram com mais de 40 ações em 19 cidades daquele Estado contra o jornal e os autores de matéria que expôs supersalários de magistrados.
Nesse caso, a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu as ações em julho até que o tribunal avalie se elas serão julgadas pela Justiça do Paraná ou pelo STF. As entidades finalizam a nota lembrando a importância do jornalismo. “Não existe sociedade livre sem o direito à informação, à reflexão e sem uma imprensa livre. E preservar esta liberdade é uma missão vital para todos nós.”
Em entrevista à Rádio CBN Vitória, Ricardo Pedreira, diretor executivo da ANJ, reforçou o direito de qualquer cidadão buscar a Justiça, se avaliar que assim o deve. Mas fez uma observação. “É preciso ficar muito claro que ninguém é contra o direito de quem quer que seja de entrar na Justiça para defender um direito que julga estar sendo atacado, para defender sua honra. Mas fazer da Justiça um instrumento para, por exemplo, constranger, intimidar o exercício do jornalismo, da livre expressão, é absolutamente inadequado, inaceitável.”
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Sindicato
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Espírito Santo (Sindijornalistas-ES) também publicou nota de repúdio às ações. “O Sindijornalistas entende que as ações são uma intimidação ao trabalho dos chargistas e uma tentativa de violação à liberdade de imprensa, um dos pilares da democracia”, afirma nota. “Manifestamos nosso total apoio ao chargista Amarildo e lamentamos que algumas pessoas não consigam conviver com a contradição que pressupõe o exercício da democracia”, finaliza a nota.
A Ordem dos Advogados do Brasil no Espírito Santo (OAB-ES) já havia criticado o incentivo a entrar com ações contra A GAZETA por causa da charge de Amarildo. O presidente da OAB-ES, Homero Mafra, declarou, conforme publicado na edição de ontem, que “o uso de ações como uma tentativa de intimidar a imprensa representam uma visão equivocada do papel do jornalismo numa sociedade livre”.
Convocação nas redes sociais
Cinco policiais entraram com ações judiciais, individualmente, contra A GAZETA e o cartunista Amarildo por causa de charge, intitulada “Carnaval 2017”, publicada em 18 de fevereiro.
Circulam por redes sociais duas mensagens, uma de texto e uma de áudio, conclamando os militares a entrarem com ações contra a empresa. As mensagens pedem que os PMs entrem com ação de indenização por danos morais. A de texto ainda disponibiliza um número de celular e um e-mail para contato.
Um homem afirma, na mensagem de áudio, que as ações terão mais força se mais policiais aderirem: “Mesmo que seja um policial ou dois ou cinquenta, a meu ver, para mim configura um dano sim. Porém como estamos diante de um Judiciário hoje que não se pode levar muito em consideração, não pode se acreditar muito, infelizmente hoje não temos uma Justiça tão cega”.
A Corregedoria da Ordem dos Advogados do Brasil no Espírito Santo abriu procedimento contra um advogado para apurar captação irregular de clientes por causa dessas mensagens. “Se os posts fossem ‘procurem seus direitos, seus advogados’, a pessoa estaria ainda dentro de uma licitude. Ela teria direito a ter uma opinião de que a charge é ofensiva. Só que ela se coloca ao dispo, dá um e-mail, dá um telefone. Aí é que a coisa muda de figura”, afirmou o corregedor da OAB, Diogo Martins.
Ações
Quatro ações foram ajuizadas em cidades da Grande Vitória e uma, em São Mateus. As cinco alegam danos morais causados pela charge e pedem indenização. As da Grande Vitória solicitam liminarmente a retirada de circulação da charge em todos os meios de comunicação da Rede Gazeta. Todos as liminares foram negadas.
Em uma das decisões, o juiz Alexandre de Oliveira Borgo diz: “Ao que parece, a charge não extrapolou o direito de livre manifestação de forma suficiente a ofender outros direitos e garantias constitucionais”.